quinta-feira, 30 de junho de 2016

albina nº14

...albina continua com suas indagações que sempre acabam em um grande momento filosófico e convidativo para uma reflexão. com seus olhos recém-saídos dos meus, olha agora mais longe do que antes e diz;

_não mudamos por pessoas pueta, mudamos por nós. as pessoas mudam por elas. mudamos para o nosso conforto e consciência, qualquer que seja a relação, social ou familiar... o triste pueta é o apego ao imediato que nunca constrói pontes. raramente pensamos nos janeiros á frente mesmo tendo tantos janeiros passados, ruins, como exemplo.

nada mais me resta além de soltar um meio sorriso diante essa faca afiada que cabe tão bem em mim.

quinta-feira, 23 de junho de 2016

albina nº2


sem olhar nos meus olhos e depois de algum tempo silenciosa, olhando vagamente para algum lugar, albina me pergunta com aquela doçura que ninguém mais tem:

_pueta, se você pudesse voltar lá no passado você mudaria alguma coisa?

sinto que albina está triste, o que é muito raro. nos poucos momentos em que vi a albina triste foi sempre quando falava dos filhos que não teve. albina certa vez até desenhou uma de suas vontades retratando uma mãe fazendo tranças no cabelo de sua filha. era ela e a criança que não pariu. nesses raros momentos os seus olhos sempre se cobriam de lágrimas que, com muita força, não rolava pela face.

_albina segunda mãe, teria tanta coisa para mudar que uma única mudança em nada refletiria no que já existi. teria dado aquele beijo que neguei para aquela negra linda na praça da matriz, só por pirraça. não teria ralhado com a maíni só porque ela saiu do tapete e foi rastejar pelo chão naquela manhã fria de junho. teria beijado mais os meus amigos. teria casado numa igreja católica com algumas das mulheres que amei mesmo eu tendo asco por igrejas, é tão lindo aquele ritual né albina? tantas coisas...

me olha e sem nenhuma expressão em seu rosto que possa identificar qual o seu humor, diz:

_ainda há tempo, mude o seu gênio e temperamento. guarde a sua língua bem guardadinha...

sexta-feira, 17 de junho de 2016

albina nº27


albina não bate na porta, entra sem cerimônia. nunca leu manoel de barros e se espalhando pelo banco vai logo me perguntando;

_pueta, qual a sensação de ser pai de seis filhos? eu nunca nem peguei barriga e olha que o finado era danado... (pensa, olha ao longe) ...e filhos por algum motivo deus não me deu. muitas vezes me deito triste, acordo triste, por não por não ter tido essa oportunidade.

_ô albina, tem tristeza maior que essa. dor maior é você ter seis filhos e nenhum ao teu lado no café da manhã.


quinta-feira, 16 de junho de 2016

albina nº22


...olho albina ao longe. ela não conheceu seus pais, ficou viúva aos 27 anos, não teve filhos e nasceu em coração de jesus-mg. não bebe, não fuma e nem palavrão fala. também não me censura em nenhuma das muitas vezes que falo durante o dia. albina é incrível, divide tudo com todos. divide até o que não tem. albina só me contraria quando diz que as rosas brancas são as mais lindas. albina nunca ouviu falar sobre yoga mas é mais zen que o renilson. isso me irrita em ambos. quando conheci albina ela usava uns chinelos pretos da marca tiutiu e ria muito quando eu estalava os dedos e dizia: _tiu tiu tiu tiu... não tinha um dente mas carregava o sol em sua boca. sorriso mais luminoso não existe. certa vez albina me perguntou;

_pueta, de quem você herdou essa calva tão brilhante?

me perguntou assim, na lata, nem preparou o meu estado de espírito.

_além da hipertireoide, isso é herança de quem não trago boas lembranças. de um tal de tanto fez e de sobrenome tanto faz. de quem não gosto de recordar. cantador boêmio que não representa nada.

albina me olha. com aquela doçura que só nós nordestinos temos, diz:

_de que vale ser pueta se não sabe perdoar? Dê-lhe graças e lhe seja grato, pois se não fosse ele quem você não teria encontrado?

me resta engolir a saliva, baixar a cabeça e ficar calado.
algumas lágrimas

sábado, 11 de junho de 2016

albina nº8


...então albina, após atravessar todo o quintal em passos apressados para seus quase 80 anos, para diante mim e pergunta;

_ora pois moço pueta bunito e triste, lembra-se de seu último surriso?

_ora pois albina que tanto parece uma mãe de santo nesse seu vestido branco, deve fazer muito tempo pois não me lembro dessa data mas ouve sim, muitos, seis quando nasceram os meus filhos, outros tantos com eles e outros tantos quando dona tereza me buscava na escola. _você não surri nem quando imbebeda, consegue ficá ainda mais longe e mais triste. meu finado marido quando bebia só ficava surrindo.

_seu eu tivesse tido a sorte do seu finado marido e um dia tivesse tido, uma única albina, sorriso seria o meu sobrenome

sexta-feira, 10 de junho de 2016

angústia


sou resistente para levantar o punho
sou resistente para receber pancadas
sou resistente para escalar morros
sou resistente para ir a pé daqui até montes claros
só não sou resistente para essas angústias que o coração traz...

terça-feira, 7 de junho de 2016

eu te chamo tereza

(para luzinete)

de montes claros a são paulo
dos passados que deixei
recordação nenhuma me acompanhou
dos beijos, dos gemidos, dos berros
de nenhum me recordo
não é uma opção
não é o instinto de defesa
em nenhum aconteceu a construção.
agora não, moça negra de olhos azuis embaçados

minha respiração é fruto da sua luta
a minha letra é fruto das suas lágrimas ao pé do leito

é claro que eu te amo
te amava também tereza
que lá de onde está, lá de cima ou ao meu lado
lhe é toda gratidão.
da entrada à saída
quando os médicos acreditavam que eu não sairia
dia e noite, você estava lá
meus pulmões parados, todo entubado
mas o coração sempre pulsava,

era a sua força ao meu lado
eu que sempre fui um poeta odioso das rimas

poeta das dores, dos anseios e das lutas
digo apenas
isso que bate em meu peito não se chama coração

se chama, amor e gratidão
que transcende toda a carne
mesmo quando fecho a porta

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 




 

 

 

 

segunda-feira, 6 de junho de 2016